Por Vanessa Alves
Estudante do 5º semestre do curso de Jornalismo da UFC e bolsista da Divisão de Comunicação da PROGRAD-UFC
O livro A Filha Primitiva, de autoria de Vanessa Passos, recebeu, em fevereiro deste ano, o Prêmio Kindle de Literatura, promovido pela Amazon.com.br, com apoio do Grupo Editorial Record e participação de Amazon Audible. Vanessa é escritora, professora de Escrita Criativa e doutora em Literatura Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Ceará (PPGLetras/UFC).
Mestre pelo mesmo programa e atualmente cursando o pós-doutorado em Escrita Criativa na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Vanessa iniciou a graduação em Letras – Português na UFC em 2010. Entretanto, a paixão pela leitura, que posteriormente faria parte da formação enquanto escritora, veio muito antes disso.
INSIGHT – Vanessa tinha quatro anos quando entendeu que a leitura significava poder e aprendeu a ler com essa idade. “Eu peguei um diário das minhas primas e comecei a folhear as páginas. Eu ainda não lia. Uma delas tomou o diário da minha mão e a outra disse ‘não tem problema, ela não lê’. A partir disso, entendi que ali havia algo muito importante e que a leitura iria me dar acesso àquilo”, diz a escritora.
A leitura enquanto prazer não demoraria a vir: antes de ser uma boa comunicadora, inclusive enquanto professora, Vanessa era uma criança tímida e encontrava nos livros os primeiros melhores amigos. Com o tempo, ela passou a desejar criar as próprias histórias. “Eu me escondia na biblioteca da escola e comecei a me fascinar por aquele universo, por aqueles livros e por aqueles personagens e queria descobrir como aqueles escritores conseguiam acessar os meus sentimentos por meio daquelas histórias”, afirma Vanessa.
PRÊMIO – A escritora e doutora em Literatura Comparada recebeu com alegria e surpresa o Prêmio Kindle de Literatura. Ela trabalhou na obra A Filha Primitiva durante quatro anos, considerando o tempo de escrita e as revisões. Ao todo, foram feitas 11 versões do livro. O resultado da sexta edição do concurso foi divulgado durante cerimônia virtual transmitida ao vivo e, na semana anterior à solenidade, os concorrentes ao prêmio recebiam uma caixa fechada com um cadeado codificado e contendo um troféu que eles não sabiam se era de finalista ou de vencedor. Eles só obtiveram o código para abrir o cadeado no momento da premiação. Sobre o que o prêmio representa para ela, Vanessa declarou: “É um grande reconhecimento, porque é um prêmio nacional. Além disso, saber que uma autora cearense, uma autora nordestina, tem alcançado espaços, furado bolhas fora do eixo Rio-São Paulo e tido uma projeção e um espaço maior no mercado editorial com um livro com personagens femininas é muito bom”.
A conquista do Prêmio Kindle de Literatura possibilitará a publicação e distribuição comercial de A Filha Primitiva no formato impresso pelo Grupo Editorial Record. Ademais, a premiação inclui uma remuneração no valor bruto de R$50 mil, sendo R$40 mil pagos pela Amazon.com.br e R$10 mil pelo Grupo Editorial Record como adiantamento de royalties. A publicação é prevista para agosto, mas a obra já está disponível no Kindle Unlimited e como e-book na Amazon.
PARTICIPAÇÃO – Enquanto cursava a graduação na UFC, a autora era bolsista de cultura e arte do projeto Sarau Entrepalavras, coordenado pela Profª Maria Claudete Lima, com a proposta de ser um espaço de discussão acadêmica da Entrepalavras, revista de Linguística do Departamento de Letras Vernáculas da UFC. Além disso, Vanessa integrou o grupo de pesquisa Espaços de Leitura: cânones e bibliotecas, coordenado pela Profª Odalice de Castro e Silva, que viria a orientá-la no mestrado e no doutorado. “Ela esteve comigo desde a graduação, quando comecei no projeto de pesquisa. Ela que me apresentou Lygia Bojunga, uma autora que eu admiro muito, e eu comecei a pesquisar processos de criação literária, então ela teve essa importância muito grande na minha trajetória acadêmica”, declara a doutora em Literatura Comparada sobre a Profª Odalice.
Entre as disciplinas que cursou na Universidade, a autora de A Filha Primitiva destaca a de Laboratório de Criação Literária, ministrada pelo Prof. Cid Ottoni Bylaardt. Vanessa considera a disciplina marcante no desenvolvimento como escritora por ela dar mais espaço para pessoas que querem não apenas lecionar ou pesquisar, mas que desejam também trabalhar com escrita ficcional.
OBRA – A Filha Primitiva é o romance de estreia de Vanessa Passos, embora não seja o primeiro livro da autora, tendo em vista que ela escreveu Manual de estilo e criação literária com a artesã Lygia Bojunga, Fábrica de histórias e A mulher mais amada do mundo. O romance premiado em fevereiro é ambientado em Fortaleza e trata de uma avó negra que esconde da filha quem é o pai dela; de uma mãe branca que rejeita a maternidade e para quem a arte é uma redenção, e de uma filha que já nasce recebendo a raiva da mãe e a dor de ser mulher.
A opção de não nomear as três personagens centrais ocorre pelo motivo de querer trabalhar na forma aquilo que já explorava no conteúdo: a invisibilidade feminina. Ainda, segundo ela, há o objetivo de fazer com que várias mulheres se identifiquem com a história, apesar de ela não ter escrito o livro para um público-alvo específico. Em contraposição, todos os personagens masculinos, mesmo os mais secundários, são nomeados, pois, conforme Vanessa, na sociedade contemporânea, é comum que as mulheres sejam reconhecidas não pelos próprios nomes, mas como pessoas relacionadas aos homens com quem têm algum laço familiar ou afetivo, ficando reduzidas, por exemplo, a esposas ou filhas de alguém. Além disso, o fato de a mãe chamar a filha apenas de ‘menina’ reforça a rejeição à maternidade presente no texto.
Vanessa estudou o silêncio e o que ele poderia representar na narrativa de A Filha Primitiva. Conforme a escritora, “quando se pensa em maternidade, a ideia do silêncio para proteger os filhos é muito comum. Mas o silêncio não protege os filhos nem a mulher. Nunca protegeu. Pelo contrário, ele só valida uma violência e um machismo estrutural que nós temos de forma muito intensa na nossa sociedade”.
A autora optou por não tratar a maternidade de maneira romantizada por ter inquietações relativas a essa abordagem, a qual desconsidera ou minimiza, por exemplo, a violência obstétrica, o julgamento da sociedade em relação às mulheres que não amamentam e os impactos da gestação para o corpo humano. O fato de o tom, o fio condutor da narrativa, ser a raiva também foi determinante nessa escolha. “A minha literatura parte de uma inquietação e vem para inquietar. Acho que A Filha Primitiva tem uma linguagem muito forte, realista, nua e crua. É quase como aquela poeira que estava embaixo do tapete, e nós tiramos e colocamos no ventilador”, afirma Vanessa.
PLANOS – Após a premiação, Vanessa Passos pretende publicar mais livros do gênero. Ela finalizou a primeira versão de seu segundo romance, um trabalho desenvolvido no pós-doutorado em Escrita Criativa na PUC-RS. É mais uma obra com um tema desafiador, em que Vanessa investiga a loucura.
A autora considera importante o diálogo com os leitores nas redes sociais acerca dos livros que escreve e, por meio do perfil no Instagram @vanessapassos.escritora, ela divulga resenhas dos leitores, clubes de leitura e palestras. A outra conta, @pinturadaspalavras, é usada para tratar de escrita e publicação.
Fonte: Vanessa Passos, escritora, professora de Escrita Criativa e doutora em Literatura Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Ceará (PPGLetras/UFC) – e-mail: vanessaeescritura@gmail.com