A partir de uma conversa informal nos corredores do Instituto de Ciências do Mar (LABOMAR), Cássia Liliane Alves Cavalcante e Anderson Tavares Vieira, ex-alunos do Curso de Ciências Ambientais da Universidade Federal do Ceará, perceberam há seis anos que existiam vários pontos de coleta seletiva instalados na UFC. Porém, as informações de onde se localizavam, e, principalmente, quais tipos de resíduos recebiam, estavam dispersas ou desatualizadas.
A dupla viu que era preciso mapear os pontos de coleta seletiva e disponibilizá-los em um único local, por exemplo, um site ou alguma outra solução tecnológica. Para além dos muros da Universidade, os estudantes compreenderam que a temática da gestão de resíduos sólidos era parte de um panorama maior, o do planejamento urbano do município de Fortaleza. Nesse contexto, surgiu o aplicativo DescarteINFO, com o objetivo de tornar mais difundidos a coleta seletiva e o descarte consciente.
De acordo com Cássia Liliane, a coleta seletiva é um dos pilares da reciclagem e deve ser incentivada. Ela se formou pela UFC e atualmente trabalha como especialista de Meio Ambiente na Secretaria de Cidades do Ceará, em um programa governamental de saneamento básico em localidades rurais. Dando seguimento aos estudos, Cássia também concluiu o mestrado em Tecnologia e Gestão Ambiental pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE).
“A reciclagem é algo que já deveria estar consolidado em nossa sociedade, uma vez que é um dos principais mecanismos para que possamos alcançar a sustentabilidade. Com tecnologias similares ao DescarteINFO, a coleta seletiva fica mais alcançável à população, pois muitas vezes falta a informação para que as pessoas pratiquem a coleta, além de ser uma ferramenta de educação ambiental”, analisa Cássia Liliane.
Após terminar a graduação, Anderson Tavares cursou mestrado em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) e atualmente é responsável pela área de Qualidade e Meio Ambiente de uma empresa privada do setor elétrico. Na avaliação dele, o DescarteINFO foi um diferencial em sua carreira e ele destaca o poder do empreendedorismo universitário e da sustentabilidade nas organizações.
“Essas tecnologias podem ser aliadas muito fortes no aspecto da reciclagem e economia circular. Em uma geração cada vez mais conectada e com acesso a um grande número de informações, é essencial um despertar para essa temática. Afinal, não existe Planeta B”, afirma Anderson.
PERCURSO – No primeiro semestre de 2016, Cássia e Anderson, ambos da mesma turma, estavam cursando o quarto e último ano de Ciências Ambientais na UFC, e, por iniciativa própria, começaram a desenvolver o aplicativo para dispositivos móveis, sem que houvesse relação com uma disciplina da graduação, um projeto de pesquisa ou de extensão universitária. Tudo isso com um desafio a mais: nenhum deles conhecia programação a fundo. Eles procuraram um programador, que topou ajudá-los nesse quesito, e a equipe teve um reforço com a chegada de Ticiana Costa, outra colega de curso, que passou a colaborar com o projeto.
Em abril daquele mesmo ano, foi lançada a primeira versão do DescarteINFO para Android. No mês seguinte, o aplicativo foi disponibilizado para iOS. Nessa etapa inicial, a ênfase era em resíduos domiciliares, orientando os usuários para a separação e o destino adequado de materiais como lâmpadas, pilhas, medicamentos vencidos, móveis velhos, eletroeletrônicos e os tradicionais papel, plástico, vidro e metal. O aplicativo pode ser baixado nessas plataformas gratuitamente, e, por meio da localização do GPS do celular, o usuário visualiza pontos de coleta seletiva, ecopontos municipais, associações de catadores e estabelecimentos comerciais que praticam a logística reversa de produtos e de embalagens.
A visibilidade alcançada pelo DescarteINFO na imprensa local serviu como vitrine também para o Curso de Ciências Ambientais da UFC, criado em 2009, conforme aponta Cássia Liliane. “Logo que a gente lançou o aplicativo, fizemos diversas entrevistas em emissoras de televisão e de rádio e em jornais. Em todas essas entrevistas, aproveitamos as oportunidades para fazer a divulgação do nosso curso, que ficou mais conhecido”, relembra.
Com a experiência de desenvolvimento de aplicativos na bagagem, Anderson e Cássia conseguiram vagas para cumprir o estágio curricular obrigatório na Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente (SEUMA), da Prefeitura Municipal de Fortaleza, e se graduaram no fim de 2016. Ela fez o trabalho de conclusão de curso (TCC) na mesma área de coleta seletiva de resíduos sólidos, enquanto ele escreveu a monografia sobre o uso da terra e degradação ambiental em Santa Quitéria, no interior cearense. Ambas as produções científicas podem ser encontradas no Repositório Institucional da UFC.
O plano de negócio do projeto passou por mudanças três anos depois, em 2019, com a marca devidamente registrada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), Cássia e Anderson decidiram criar uma startup para gerir o aplicativo. Em 2020, o DescarteINFO ganhou um formato web e se tornou acessível à população fortalezense e empresas parceiras por meio de um site, que reúne informações, como endereço, contato telefônico, horários de funcionamento e categorias de resíduos a serem encaminhados aos pontos de coleta seletiva da cidade.
O DescarteINFO possui mais de 500 pontos cadastrados em Fortaleza, que recebem 20 tipos diferentes de resíduos, além de recomendar pontos de descarte de lâmpadas em todo o Brasil. Até hoje, o aplicativo já obteve cerca de 7 mil downloads, com o potencial de ser replicado nacionalmente.
“Caso a nossa iniciativa seja difundida na grande mídia e em âmbito nacional, não tenho dúvidas de que contribuiria para uma sociedade mais sustentável e responsável em relação aos resíduos gerados, em que todos ganhariam: recicladores, poder público e sociedade”, comenta Anderson.
RESULTADOS – Em 2016, o DescarteINFO foi premiado com o 1º lugar no Concurso Hacker Cidadão, organizado pela Prefeitura de Fortaleza, Fundação de Ciência, Tecnologia e Inovação (CITINOVA), IBM e Universidade de Fortaleza (UNIFOR). No ano seguinte, o Ministério do Meio Ambiente reconheceu o aplicativo como “Prática de Referência na Estratégia Nacional de Educação Ambiental e Comunicação Social na Gestão de Resíduos Sólidos – Educares”, divulgando a iniciativa para o País inteiro na plataforma virtual Educambiental, pela contribuição dada à Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal nº 12.305/2010).
No âmbito regional, a Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SECITECE) do Governo do Ceará selecionou o DescarteINFO como prática inovadora no Salão do Inventor Cearense e nos Corredores Digitais, programa de fomento ao empreendedorismo e à inovação. Os projetos selecionados puderam participar de hackathons, mentorias, capacitações, rodadas de negócios e networking para empreendedores.
No ano passado, Anderson Tavares foi convidado pela Profª Juliana Melo, do LABOMAR, e voltou à UFC para dialogar com os alunos da disciplina de Certificação e Auditoria. Na ocasião, ele pôde trocar ideias e compartilhar experiências com os colegas sobre certificações ambientais e o mercado de trabalho dos cientistas ambientais. “É sempre um prazer contribuir com a Universidade. Sempre que possível retorno para ministrar minicursos, palestras e aulas”, revela.
Fonte: Coordenação do Curso de Ciências Ambientais da UFC – e-mail: cienciasambientais@ufc.br
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